O dia em que a vida parou
faça-se cumprir o estado de emergência porque nenhum status social pode sobrepor-se ao intrínseco valor da vida
28 MAR 2020 / 02:00 H.
Um microscópico vírus parou, literalmente, a vida no Mundo. A corrida ao armamento nuclear passou para segundo plano e os conflitos mundiais deram lugar ao fechar fronteiras para contenção de um vírus chamado coronavírus/ covid-19. As bolsas mundiais contiveram-se nas transações financeiras, mola real das grandes economias, e até os atentados terroristas foram esquecidos. Os poderosos Trump, Putin, Xi Jinping, ditadores ou democratas, acagaçaram-se perante um minúsculo vírus apenas detetável com a ajuda de um microscópio. Os seus bunker anti-nuclear tornaram-se obsoletos ante a ameaça deste temível inimigo mortal mais forte do que todo o seu poder bélico. Quão ridículos se devem sentir ao perceberem que todo o seu poder militar de biliões de dólares são tão vulneráveis como a “habitação” de um sem abrigo. Perceberam que apesar dos seus mísseis, terra-terra ou terra-ar, as suas mortíferas bombas nucleares, os seus poderosos porta-aviões ou toda a sua tecnologia de ponta, estão tão vulneráveis como o comum dos mortais cuja única proteção resume-se a uma máscara anti-gotículas que custam apenas alguns euros.
Por imposição de um micro-organismo emanado de uma natureza que tão mal tratamos, estamos literalmente presos em casa sujeitos a uma medida de coação que nem necessita de pulseira eletrónica. Cabe aqui lembrar que se torna-se imperativo pensar uma maneira de combater o isolamento forçado de milhões de pessoas que, por via disso, arriscam a sua sanidade mental e depois da pandemia do vírus, enfrentaremos outra do foro psicológico.
Quão insignificantes se devem sentir as grandes estrelas do mundo do espetáculo, futebol, ténis e outros que se sentiam seguros no seu pedestal da fama e de um momento para o outro foram esquecidos. Os homens dos milhões que tudo compram e todos corrompem, aperceberam-se que estão rigorosamente no mesmo pé de igualdade daqueles que têm apenas tostões.
Uma lição futura podemos aprender com este maldito vírus, covid-19; é extremamente democrático, não discrimina ricos, pobres, pretos ou brancos, fracos ou poderosos. Veio mostrar e impor ao Mundo a tão propalada igualdade de que todos falam mas poucos praticam.
Num momento em que os homens parecem ter ensandecido, por incompetência, estupidez e incoerência, a mãe natureza talvez quisesse enviar este emissário para lembrar quão frágil é a espécie humana e mostrar que temos obrigatoriamente de corrigir o nosso percurso de vida.
Sabemos como e quando esta pandemia começou mas não sabemos como e quando irá acabar, já que os governantes, os cientistas e a nossa geração nunca enfrentou uma hecatombe de tal dimensão mundial e, como tal, não estavam (ainda não estão) preparados para ela. Até os agentes de saúde estão vulneráveis.
Espera-se e deseja-se que em breve seja descoberto uma cura ou vacina para erradicar este medonho vírus, todavia os efeitos colaterais far-se-ão sentir, no futuro, através de uma terrível recessão da economia mundial cujo os efeitos serão equivalentes a uma “bomba nuclear” com as consequências inevitáveis nos postos de trabalho das pequenas e médias empresas. É certo que o avanço da tecnologia permite-nos o teletrabalho mas não poderá haver trabalho se não houver clientes/consumidores.
Doí-me imenso olhar para as ruas desertas da minha cidade, outrora tão cheia de vida e de turistas, os quais aprendemos a tratar como vizinhos, e compreendemos que sem eles o Funchal é uma cidade sem vida. Do mesmo mal padecem ricas, e extravagantes cidades como Nova Iorque, Paris, Londres, Tóquio, as cidades que nunca dormem, e estão hoje mortas, com as sua ruas desertas, com o comercio e indústria a definhar e com pessoas amedrontadas.
Talvez a natureza nos queira recordar que os poderosos, com os seus milhões, têm nas mãos uma “vacina” chamada comida que mitigaria a fome aos necessitados mas, esses milhões ainda não serviram para criar uma vacina contra um inimigo invisível.
Sou democrata e acérrimo defensor dos valores democráticos, aos quais sempre faço apologia, porém, parafraseando Manuela Ferreira Leite, se tal for necessário para combater este inimigo mortal chamado covid 19, suspenda-se a democracia e faça-se cumprir o estado de emergência porque nenhum status social pode sobrepor-se ao intrínseco valor da vida humana. Termino com uma palavra de conforto e estímulo para aqueles que, como eu, estão, literalmente, prisioneiros ; pela sua saúde, fiquem em casa, na certeza de que quanto maior for agora o isolamento social, mais cedo nos voltaremos a abraçar, no futuro.
“As únicas desgraças completas são aquelas com as quais nada aprendemos.” William Ernest Hocking
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